domingo, 21 de julho de 2013

Oportunidade para repensar o Brasil

A situação brasileira vem se deteriorando lentamente. A face mais aparente  é a crise político-institucional expressa pelas recentes manifestações. O que começou com um grande protesto contra o aumento das passagens de ônibus em São Paulo ampliou-se com críticas aos gastos com a Copa do Mundo e generalizou-se com protestos contra a política e os políticos.

Mas além dessa crise política há outra crise sorrateira e com desdobramentos sérios também: a crise econômica. O baixo crescimento econômico, a ameaça de descontrole da inflação, a desindustrialização constante e o nosso isolamento dos grandes blocos econômicos do mundo são sinais de que temos sérios problemas.

A situação econômica fica mais preocupante se levarmos em conta que estamos no melhor momento de nossa demografia (o “bônus demográfico).

O governo tenta demonstrar que tem a situação sob controle, mas o fato é que “comemos do almoço e comida que era para o jantar”.  O endividamento das famílias praticamente dobrou nos últimos anos, nossa dívida bruta cresceu 7% nos últimos quatro anos, os investidores têm aumentado sua desconfiança na economia brasileira, entre outras questões.

Essas duas crises, política e econômica, são um sério problema para o futuro próximo do Brasil, mas podem representar também uma janela de oportunidades para que o país comece um novo ciclo de desenvolvimento. Onde há crise, há oportunidade de se discutir coisas até então consideradas certas. Acredito que podemos melhorar em muito o Brasil se aproveitarmos essa oportunidade e desconstruirmos certas crenças que nos travam, como a falso conceito de que existe “almoço grátis”, a sacralização/demonização da política e a subvalorização do papel dos empreendedores.

Os governos ajudam a difundir a ideia de que não é o dinheiro do contribuinte que paga a conta dos “benefícios” que eles trazem à população. Eles fazem crer que trata-se de um recurso mágico, ou seja, que há “almoço grátis”. Devemos acabar com essa praga populista. As escolhas deverão ser feitas com parcimônia e os gastos, com eficiência. O questionamento recente das manifestações sobre os gastos com a Copa do Mundo é um alentador sinal de que a população se interessa cada vez mais pelo uso dos recursos públicos.

O processo eleitoral no Brasil virou uma espécie de vestibular para a escolha do “salvador da pátria”. Endeusa-se um candidato e demoniza-se o adversário. Cria-se um clima de procura de alguém para “arrumar” o País . Até o TSE nos adverte de que temos votado de maneira errada (O voto tem consequência!) e que é preciso encontrar o “candidato certo”. Há algo de mágico em torno nas eleições e isso é prejudicial ao aperfeiçoamento democrático. Por trás dessa magia está o endeusamento (e posterior demonização) do governante e do governo como se necessitássemos de sua tutela. O processo eleitoral deveria ser simplificado (menos tempo de campanha); as eleições deveriam ser todas majoritárias (voto distrital para parlamentares) e os candidatos deveriam propor o que pensam e não o que convém para ganhar as eleições.

Se o eleito fizer o contrário do que propôs, ele deve ser impedido pelos seus eleitores, sem maiores traumas. Para tanto, é preciso simplificar o processo eleitoral. Com isso, as campanhas e as eleições seriam mais baratas e o processo de impedimento seria menos traumático e, consequentemente, haveria mais eficiência e eficácia dos governos e dos parlamentos.


Por fim, gostaria de falar sobre o papel dos empreendedores. O mundo de amanhã será igual ao mundo de hoje até que haja empreendedores. Se não houvesse pessoas dispostas a sair da rotina e empreender haveria uma circularidade da vida. Não estou falando somente da economia, mas da multiplicidade de atividades humanas. É preciso se reconhecer que o ato de empreender, embora tenha uma motivação individual, tem conseqüências públicas na maioria das vezes. É preciso acreditar nas pessoas em todas as suas dimensões sociais. Uma sociedade que valoriza cada um acaba sendo uma sociedade de todos e não vice-versa. Sou otimista com o que vai acontecer com o Brasil. Acredito que as crises pelas quais estamos passando servirão de alavanca para um novo país muito melhor.

domingo, 23 de junho de 2013

Esperança de um Brasil melhor

Li, há alguns anos, um interessante livro de Nassim Taleb chamado “A lógica do Cisne Negro”. O livro trata dos fatos novos e improváveis como o 11 de Setembro. Até a descoberta da Austrália, acreditava-se que somente existiam aves brancas até que os cisnes negros fossem ali descobertos. Lembro-me desse livro vendo o desenrolar das manifestações que se espalham por todo o país como um fenômeno social de tal porte e difícil de ser avaliado. É certo que levará algum tempo para ser compreendido, mas alguns recados já começam a ser identificados.

O recado mais evidente é a insatisfação com o aumento do transporte urbano, a corrupção, a qualidade dos serviços públicos e os gastos com as Copas de futebol. Mas o recado síntese é o profundo descontentamento com a política, com os políticos e com algumas instituições democráticas. Vou me arriscar a tecer alguns comentários ainda no calor dos acontecimentos.

Percebi nas ruas, desde as eleições municipais do ano passado, que há um sentimento de mudança em vez do sentimento de continuidade que antes prevalecia. Até a eclosão das manifestações eu acreditava que esse sentimento latente de mudança iria se refletir nas eleições de 2014, com a troca de governos, mesmo os bem avaliados. A população está cada vez mais exigente e é bom que seja assim.

Mas a extensão e a intensidade das manifestações me fazem ver que esse sentimento de mudança é mais profundo. Quer se mudar a política e os políticos. A partir das minhas observações, adquiridas no exercício de 17 anos de mandato, vejo algumas dessas mudanças exigidas.

Ganha-se as eleições propondo algumas coisas e, na cara de pau, governa-se fazendo outras. Essa prática desmoraliza o processo eleitoral e desacredita o processo democrático. A falta de respeito com o eleitor é flagrante.

A honestidade pessoal e intelectual, vital para a política, está cada vez mais rara. Preocupa-se mais em parecer do que em ser. Há uma ética da boca para fora e uma ética comportamental de que a “política não se faz com romantismo”. Vários colegas que não pensam assim estão deixando a política.
A falta de espírito público tem aumentado. Escolher bem as prioridades, fazer o recurso público render mais, valorizar o cidadão afirmativo, procurar dar o exemplo não têm a prioridade que deveriam ter.

Há, também, uma questão de forma. O atual sistema político eleitoral está se esgotando. E já não se pode somente remendá-lo. A representação política não pode ser como é hoje, em que o candidato vai buscar voto em todo o universo eleitoral. 

É preciso adotar o voto distrital, pois assim, se algum parlamentar trair seus representados, o distrito cassa o seu mandato e não compromete toda a representação. E o que está em xeque hoje é todo o sistema de representação.
Onde está o chefe de Estado para conduzir essa crise em que vivemos? Não estou me referindo a nenhuma pessoa. Estou dizendo que é preciso ter uma figura de chefe de Estado não contaminado pelo dia a dia da política. Já há vozes no Congresso Nacional de que a saída da crise é promover uma constituinte exclusiva para debater esses problemas, pois o Parlamento normalmente eleito não consegue enfrentar essas questões. Serão as manifestações a alavanca necessária para isso? É o que veremos com o desdobrar dos eventos.

Gostaria de terminar dizendo que a forma pode ajudar muito a resgatar a crença na nossa democracia representativa. Mas, qualquer que seja a forma, os indivíduos que personificam essa e qualquer outra forma deveriam ter alguns princípios e valores: seja honesto pessoal e intelectualmente; não roube e nem deixe roubar; seja parcimonioso tanto na campanha como no exercício do mandato. Eleição é um contrato que o eleitor acredita e vota, mas quer receber o que foi prometido.


Pelo entusiasmo patriótico das manifestações há esperança de um Brasil melhor.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

A chefe de Estado sumiu

Ao longo da história, com experiências amargas e crises, a nações desenvolveram instituições capazes de superá-las. Uma dessas instituições foi estabelecer a distinção entre Chefia de Estado e Chefia de Governo. Quando há crise ou ameaça de crise, o Chefe de Estado intervém para debelá-la. Em alguns países essa Chefia de Estado é representada por um monarca (Reino Unido, Espanha etc), noutros é representada por presidentes e a Chefia de Governo nesses países é exercida pelo primeiro ministro. No Brasil, essas duas figuras concentram-se na Presidência da República, tal como ocorre nos EUA e em boa parte dos países americanos.

Fiz essa introdução para mostrar uma preocupação. Com o objetivo da reeleição, a presidente Dilma Roussef  tende a diminuir o seu papel da Chefia de Estado ao entrar de cabeça nas disputas típicas do chefe de Governo e ao não “comprar brigas” para evitar desgastes eleitorais.

Eu disse aqui, um tempo atrás, dos problemas administrativos que a presidente iria criar quando do lançamento da sua reeleição no começo do ano. Mas o problema institucional que está se armando pode ter conseqüências ainda mais sérias para o futuro do País. Vou citar três exemplos de problemas que se acumulam, o que não ocorreria se a Chefe de Estado estivesse sendo exercida.

O primeiro refere-se à tensão entre as unidades federadas. É o caso da nova divisão dos royaties e participações do petróleo quando Estados como Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo sentiram-se lesados.

O mesmo ocorreu com a criação de novos Tribunais Regionais Federais. Um dos principais prejudicados é o Rio Grande do Sul. Um problema ainda maior foi a Resolução aprovada no Senado sobre o ICMS interestadual em que vários estados se sentiram prejudicados (São Paulo, Rio, Goiás etc). Se houvesse a “mão firme” e isenta da chefe de Estado essas tensões não se acumulariam.

O segundo problema são as seguidas e crescentes tensões entre os poderes. No momento, assistimos vários embates entre o Legislativo e o Judiciário, mas isso também ocorre entre o Legislativo e o governo, como se viu na recente votação da MP dos Portos.

Qualquer tentativa de reforma política ou institucional é vista com desconfiança pelas partes envolvidas, preocupadas com a perda de poder. Falta uma figura isenta para encaminhar e negociar soluções perenes.

Por último, gostaria de citar a forte ingerência do governo à criação de novos partidos. O projeto que impede a portabilidade do tempo de TV e do fundo partidário para os deputados que migrem para um novo partido soa casuístico, já que, na atual legislatura, o novo PSD teve esse direito. Esse caso está no STF quando deveria ser objeto de uma visão a longo prazo e não de interesses momentâneos do Executivo. Nesse caso, cria-se a desconfiança nas regras do jogo e a tendência é involuirmos para o nível de republiqueta que, com muita dificuldade, havíamos superado nesses últimos 25 anos de democracia.


Não vejo crises institucionais mais graves no curto prazo, mas as tensões e desconfianças se avolumam e podem ganhar as ruas. A chefe de Estado sumiu!